domingo, 15 de janeiro de 2012


Romarias crescem a cada ano no Interior do Ceará

15.01.2012
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FOTOS: ELIZÂNGELA SANTOS
A Festa de Nossa Senhora das Candeias é considerada a terceira maior romaria de Juazeiro do Norte. Realizada de 29 de janeiro a 2 de fevereiro, abre o calendário de devoções católicas na Terra do Padre Cícero
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Vindos de diferentes Estados do Nordeste, os romeiros são populares que acreditam na força do Padim para a cura de doenças e melhorias de vida
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FOTO: SILVANA TARELHO
A movimentação durante as romarias impulsiona o comércio na cidade, que costuma receber cerca de três mil trabalhadores informais
A cada ano, levas de fiéis que somam cerca de 3,5 milhões de pessoas visitam Juazeiro durante as romarias
Juazeiro do Norte O grande cordão de fé se estende pelo Ceará. Um dos Estados mais católicos do Nordeste, é marcado por romarias crescentes. Os milagres, a peregrinação, os rostos sofridos e resignados que chegam aos locais considerados sagrados vivenciam o fenômeno da catarse coletiva. Como explicar tanta devoção, a busca incessante pelo divino? Por meio de intercessores.

O exemplo da longa trajetória missionária para os romeiros não se traduz em simples palavras, mas é também vivenciada e sentida. Em cidades como Canindé e Juazeiro do Norte, os dois principais centros de romarias do Estado, estima-se que, a cada ano, passem mais de 3,5 milhões de pessoas. Nessas localidades, as levas de fiéis são consideradas crescentes e todos os dias são dias de romaria.

A Romaria de Nossa Senhora das Candeias, a terceira maior festa religiosa da cidade, atrai, segundo a Igreja, em torno de 300 mil romeiros. Transformou-se num dos mais belos espetáculos de fé do Brasil. De 29 de janeiro a 2 de fevereiro, Juazeiro passa a ser local onde o peregrino de sente acolhido. As luzes acendem diferentes motivações, em busca do fortalecimento da fé.

Calendário
Anualmente, há três grandes romarias na cidade. O ano é iniciado com a devoção a Candeias. Após a festa, outros momentos, que não são catalogados, como grandes romarias, atraem um número expressivo de visitantes, em feriados como Carnaval, Semana Santa, e final de ano, com o período de férias. Há ainda o louvor à padroeira, Nossa Senhora das Dores, com uma festa de 15 dias e mais cinco dias de romaria na cidade, e a de Finados, de que dura três dias e atrai o maior número de fiéis de todas as festas, cerca de 600 mil pessoas.

Em Juazeiro, a primeira romaria começou com a necessidade de entendimento de um milagre. Todo o Nordeste era chamado para conhecer a história de uma beata e de um padre. Foi Maria de Araújo, como já alertaram alguns pesquisadores, que protagonizou o famoso milagre do sangramento da hóstia ofertada pelo Padre Cícero Romão Batista. Em março de 1889, o ano do "milagre da hóstia", a história do pequeno vilarejo no sul do Ceará mudaria para sempre os rumos da religiosidade no Estado.

O milagre foi o chamariz da primeira leva expressiva de romeiros, que saíram do Crato, comandada pelo monsenhor Francisco Monteiro. "A multidão veio assistir ao milagre. O monsenhor subiu no púlpito e chorou", conta o escritor e jornalista Gerado Menezes Barbosa.

Ele acrescenta que, naquele dia, o monsenhor foi enfático ao afirmar que preferiria ficar cego a negar o que havia visto. Todavia, o clérigo foi obrigado a negar o que viu, pelo bispo dom Joaquim José Vieira. Em seis meses, ficou cego, segundo o escritor. O monsenhor, arrependido, chegou a ser conduzido pelo padrinho às celebrações, após a perda da visão. Foram dois anos de julgamento, durante os quais a própria Igreja Católica procurou negar que uma costureira negra e pobre poderia ser agente de um milagre. A dúvida até hoje persiste: ela fez o milagre? A hóstia teria chegado a sangrar 96 vezes, uma delas nas mãos da beata. O Padre pagou a pena com a excomunhão.

Enquanto ele foi afastado de ordens, por conta da história que se espalhou por todo o Nordeste na rapidez dos rastilhos de pólvora, os milagres se multiplicavam, fazendo com que nascesse o santo do Nordeste, canonizado pelo povo. Foi erguido o grande monumento em homenagem ao "Padim" e milhões de imagens entraram nos lares do povo sofrido pelo sol causticante da caatinga. O domínio da fé e do messianismo passou a ser uma marca nos sertões do Brasil.

Contemporâneo do Padre Cícero, Gerado Barbosa vivenciava, da porta de casa, aos sete anos de idade, o vai e vem dos romeiros nas ruas da cidade. Para o escritor, uma das explicações para o aumento das romarias na cidade está no encaminhamento natural dos novos seguidores. As famílias que vêm à terra do Padre Cícero sempre estão acompanhadas pelos filhos. "A eles (os filhos), é ensinado o caminho e a razão da devoção".

FIQUE POR DENTRO
Principais romarias de Juazeiro
De 28 de janeiro e 2 de fevereiro, ocorre a Romaria de Nossa Senhora das Candeias, uma das mais belas, na qual os participantes acendem velas e percorrem as principais ruas do Centro da cidade na procissão de encerramento. De 29 de agosto a 15 de setembro, há a Romaria de Nossa Senhora das Dores, padroeira de Juazeiro. Uma média de 400 mil visitantes participam da homenagem. De 29 de outubro a 2 de novembro, há a Romaria de Finados, a qual é a maior romaria do ano. A homenagem atrai mais de meio milhão de romeiros, que escolhem como principais locais de visitação a Capela do Socorro, onde estão os restos mortais do Padre Cícero, e o Santuário dos Franciscanos.

Acolhimento ainda é deficiente
Em busca da salvação, os romeiros percorrem os quatro cantos da cidade de Juazeiro. Uma característica diferenciada dos grandes centros de peregrinação do Brasil é que não há um lugar específico para reverência. São diversos pontos estratégicos para visitação, desde a Basílica Menor de Nossa Senhora das Dores à estátua do sacerdote, de 28 metros, no Horto, a Capela do Socorro, onde se encontram os restos mortais do Padre, aos santuários da cidade. A cidade cresce em 100 anos de fundada de uma forma assustadora.

Juazeiro passou a ser um solo sagrado para os romeiros. Segundo o secretário de Desenvolvimento, Turismo e Romarias, José Carlos dos Santos, a estimativa é que a cidade receba, a cada ano, cerca de dois milhões de pessoas. Essa realidade se divide ao longo do ano.

E essa realidade da "chegança" dos peregrinos é atendida com uma infraestrutura que ainda deixa muito a desejar, principalmente relacionada ao acolhimento dos romeiros. O poder público e a própria Igreja, segundo o escritor Geraldo Menezes Barbosa, ainda não acordaram para essa realidade.

Conforme José Carlos dos Santos, o comércio informal passa a ter uma forte representatividade em Juazeiro. Durante as grandes romarias, são mais de três mil trabalhadores informais que aportam no Município. Atualmente, esses setores estão buscando maior organização, depois da inauguração do Mercado dos Romeiros.

O olhar voltado ao turismo religioso fez com que o Brasil e o mundo identificassem Juazeiro do Norte como um ponto que chama a atenção de grandes investimentos, no setor público e privado. Vários projetos estão sendo planejados, segundo o secretário, para investimentos na área de infraestrutura, para garantir uma melhoria na acolhida do romeiro, a exemplo do Roteiro da Fé, que irá integrar os principais pontos de visitação. Ainda este semestre está prevista uma chamada pública para a instalação de um bondinho, que interligará a Basílica ao Horto.
Também está sendo construído o centro multiuso, no valor de R$ 10 milhões, onde está inserido um anfiteatro com capacidade para 10 mil pessoas. Os milhares de veículos que chegam à cidade terão espaço num gigantesco estacionamento que está sendo construído. Mas, para José Carlos, ainda falta muito para atender à grande nação romeira. Ele admite que esta realidade deveria ser atendida com uma política pública específica.

Enquanto isso, ranchos e pousadas improvisam a chegada permanente, e os romeiros começam a reclamar por melhores condições, já que os preços praticados nesses locais e nos próprios restaurantes estão aquém da qualidade que oferecem.

ELIZÂNGELA SANTOSREPÓRTER
http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=1094006

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